Artigos


A GRAÇA DE CRER





Se a existência humana se mostra como abertura para o mistério, então acolher na fé esse mistério é graça e, ao mesmo tempo, suprema realização da inteligência e da liberdade. Estamos naturalmente falando da revelação de Deus, à porta de quem a inteligência humana, pesquisando seus vestígios na natureza e na própria existência, vem postar-se na suplicante expectativa de que essa porta lhe seja aberta pela misericordiosa bondade daquele mesmo que a fez assim, faminta da suprema verdade. É nesse sentido que a carta encíclica “Fé e Razão” afirma que “uma implica a outra” (nº 17).
A revelação só é possível se a razão humana for capaz de recebê-la e reconhecê-la como manifestação livre, pessoal e generosa daquela Verdade que essa mesma razão sabia presente, embora oculta, como fundamento transcendente da própria existência e da existência da totalidade do universo. A fé, como resposta obediente á revelação divina, pressupõe, pois, que a razão humana, debruçando-se sobre a realidade criada, seja capaz de chegar ao conhecimento da existência e da bondade do Criador, estando por isso permanentemente aberta a uma possível revelação pessoal de Deus.
Por ser resposta à livre revelação de Deus, a fé é graça, fruto do sopro interior do Espírito na inteligência e no coração do ser humano: “a verdade que a Revelação nos dá a conhecer não é o fruto maduro ou o ponto culminante dum pensamento elaborado pela razão. Pelo contrário, aquela se apresenta com a característica da gratuidade, obriga a pensá-la, e pede para ser acolhida, como expressão de amor” (Fé e Razão, nº 15).Sem profunda humildade não se pode chegar a fé.
A razão nos leva à soleira do mistério. Pela revelação o mistério insondável de Deus se abre para nós como puro dom, revelando-se a nós e revelando para nós a razão última da grandeza e da dignidade de nossa inteligência: poder entrar na posse pessoal da verdade do próprio Deus. Esse encontro com a revelação abre para a razão um horizonte novo, inesperado e surpreendente, pois introduz-nos no inesgotável mistério da infinita e suprema verdade.
A fé jamais pode ser pensada como negação da inteligência; pelo contrário, ela é um ato de entrega amorosa e agradecida do ser humano ao mistério da verdade suprema, sua razão de ser e razão de sua incessante busca. Há pessoas que se gabam de ter uma religião cientificamente fundamentada, filosoficamente fundada e plenamente dentro dos limites da razão humana, sem mistérios.
Houve uma época – aí pelo se. XVIII – que alguns pensadores imaginaram uma religião puramente natural, sem revelação, fundada tão somente na capacidade da razão humana. Deus seria tão somente o supremo arquiteto, uma figura exigida pela lógica da razão para justificar a existência do universo. Um Deus assim teria as dimensões da razão humana; não seria Deus e nem seria capaz de responder ao anseio do coração humano à procura de uma verdade superabundante na qual ele pudesse saciar sua infinita fome de ser.
A verdade revelada é mistério não porque, impenetrável, lança nas trevas o entendimento humano, mas sim porque se constitui em um abismo de luz que inunda o pensar e o sentir do homem, oferecendo-se sempre de novo como resposta inesgotável ao infinito desejo da criatura finita. O ato de fé é, na terra, a realização suprema da inteligência humana feita que foi para consumar-se na posse da Verdade.
Crer, entretanto, é graça somente acolhida por aqueles que buscam de todo coração o mistério de Deus. Esses são os pequeninos a que se refere Jesus: “eu te louvo, ó Pai, Senhor do céu e da terra, porque ocultastes estas coisas aos sábios e as revelastes aos pequeninos” (Mt 11, 25). Se desejamos crer, devemos cultivar um coração suplicante.
Dom Eduardo Benes de Sales Rodrigues




**************************************************************





 A N O  D A  F É:  I N D U L G Ê N C I A S 

Por Indulgência deve se entender a remissão diante de Deus da pena temporal devida aos pecados, já perdoados quanto à culpa, que o fiel, aptamente disposto e em condições bem definidas,consegue por meio da Igreja que, como ministra da Redenção, tem o poder de conceder, valendo-se do tesouro das satisfações de Cristo e dos Santos. ( Normas sobre a Indulgências, n. 1). 

Para uma correta compreensão do significado das indulgências, devemos distinguir no pecado a culpa e a pena que decorre da culpa. A pena que decorre da culpa, quando se trata de pecado mortal, é a condenação eterna. A necessidade de reparação das consequências do pecado grave e dos pecados veniais é a pena temporal. A pena eterna é remida com a remissão da culpa na absolvição sacramental. A pena temporal deve ser remida pela penitência e pela purificação espiritual, fruto da intensificação do amor a Deus. A pena decorre da necessidade de reparar as consequências do pecado quer na própria pessoa do pecador quer na vida da Igreja. O pecado causa danos espirituais que precisam ser reparados. Essa reparação é feita mediante o empenho em viver com mais profundidade o evangelho, procurando crescer em caridade com o auxílio do Espírito Santo. 

Se durante nossa vida na terra não conseguirmos a plena reparação das consequências de nossas faltas, deveremos passar por uma purificação logo após o juizo particular, como nos ensina o catecismo da Igreja Católica A esse processo chamamos de purgatório. “A indulgência obtém-se mediante a Igreja que, em virtude do poder de ligar e desligar que lhe foi concedido por Jesus Cristo, intervém a favor dum cristão e lhe abre o tesouro dos méritos de Cristo e dos santos, para obter do Pai das misericórdias o perdão das penas temporais devidas pelos seus pecados. É assim que a Igreja não quer somente vir em ajuda deste cristão, mas também incitá-lo a obras de piedade, penitência e caridade» (CIC 1478).
“Uma vez que os fiéis defuntos, em vias de purificação, também são membros da mesma comunhão dos santos, nós podemos ajudá-los, entre outros modos, obtendo para eles indulgências, de modo que sejam libertos das penas temporais devidas pelos seus pecados”( CIC 1479).
               
 A Penitenciaria Apostólica, com a finalidade de alcançar o dom das Indulgências durante o Ano da fé, estabeleceu as seguintes disposições, emitidas em conformidade com a mente do Augusto Pontífice, para que os fiéis sejam mais estimulados ao conhecimento e ao amor pela Doutrina da Igreja Católica e obtenham frutos espirituais mais abundantes.
              
  Ao longo de todo o Ano da fé, proclamado de 11 de Outubro de 2012 até ao fim do dia 24 de Novembro de 2013, poderão alcançar a Indulgência plenária da pena temporal para os próprios pecados, concedida pela misericórdia de Deus, aplicável em sufrágio pelas almas dos fiéis defuntos, a todos os fiéis deveras arrependidos, que se confessem de modo devido, comunguem sacramentalmente e orem segundo as intenções do Sumo Pontífice:
                       
Elenco das situações em que o fiel poderá ganhar as indulgências:

a)      Cada vez que participar de pelo menos três palestras sobre o Concílio Vaticano II e sobre os Artigos do Catecismo da Igreja Católica.

b)      Cada vez que, em forma de peregrinação, visitar, em grupo com a devida preparação e com o objetivo de professar e melhor compreender os artigos do credo, a Catedral de Sorocaba, o santuário de Aparecidinha e o Santuário de São Judas. Também as peregrinações ao Santuário Nacional de Aparecida, nas mesmas condições, ficam indulgenciadas e outros Santuários de nosso País Deve nesses locais participar de alguma “função sagrada ou pelo menos passarem um tempo côngruo de recolhimento com meditações piedosas, concluindo com a recitação do Pai-Nosso, a Profissão de Fé de qualquer forma legítima, as invocações à Bem-Aventurada Virgem Maria e, segundo o caso, aos Santos Apóstolos ou Padroeiros”. A visita ao Santíssimo – adoração onde houver – deve ser especialmente incentivada nessa ocasião.

c)       “Cada vez que, nas solenidades do Senhor, da Bem-Aventurada Virgem Maria, nas festas dos Santos Apóstolos e Padroeiros, na Cátedra de São Pedro, em qualquer lugar sagrado participarem numa solene celebração eucarística ou na liturgia das horas, acrescentando a Profissão de Fé de qualquer forma legítima”. (Sobretudo na celebração dos(as) padroeiros(as) sejam organizadas pregações sobre a vida de fé, tendo o Concílio e o Catecismo da Igreja Católica com fonte, e enaltecendo o testemunho de fé do(a) padroeiro(a).

d)      “Em um dia livremente escolhido, durante o Ano da fé, para a visita piedosa do batistério ou outro lugar, onde recebeu o sacramento do Batismo, se renovar as promessas batismais com qualquer fórmula legítima”.

e)      “Os fiéis verdadeiramente arrependidos, que não puderem participar nas celebrações solenes por motivos graves (como, em primeiro lugar, todas as monjas que vivem nos mosteiros de clausura perpétua, os anacoretas e os eremitas, os encarcerados, os idosos, os enfermos, assim como quantos, no hospital ou noutros lugares de cura, prestam serviço continuado aos doentes), obterão aIndulgência plenária nas mesmas condições se, unidos com o espírito e o pensamento aos fiéis presentes, particularmente nos momentos em que as Palavras do Sumo Pontífice ou dos Bispos diocesanos forem transmitidas pela televisão e rádio, recitarem em casa ou onde o impedimento os detiver (por ex. na capela do mosteiro, do hospital, da casa de cura, da prisão...) o Pai-Nosso, a Profissão de Fé de qualquer forma legítima e outras preces segundo as finalidades do Ano da fé, oferecendo os seus sofrimentos ou as dificuldades da sua vida”. (Nas festas dos(as) padroeiros(as) atender e preparar os idosos e enfermos para se unirem espiritualmente à grande celebração, bem como, em se tratando de alguma peregrinação organizada pela paróquia, unirem-se aos peregrinos.

f)        O fiel que participar da Santa Missa no dia da Padroeira da Arquidiocese na Catedral (15 de agosto) e na celebração de Cristo Rei (24 de novembro) – encerramento do Ano da Fé -, receberá aBênção Papal com a Indulgência plenária, cumpridas as disposições exigidas para tal. (Também os que participarem na missa da Padroeira de Porto Feliz, presidida pelo Arcebispo).


Obs.: Os Párocos e Catequistas bem como os coordenadores de pastorais e de movimentos procurem explicar o significado das indulgências, insistindo nos objetivos do Ano da Fé e valendo-se do Catecismo da Igreja Católica (cf. CIC 1471- 1479) que expõe com clareza o necessário para compreender as indulgências e como recebê-las do tesouro da Igreja.

                                                                                                 Sorocaba, 30 de novembro de 2012

                                                                                         Dom Eduardo Benes de Sales Rodrigues
                                                                                                                      Arcebispo Sorocaba/SP







Artigo - Papa convoca para o Ano da Fé
Dom Eduardo Benes de Sales Rodrigues - Arcebispo de Sorocaba 


Foto: Artigo - Papa convoca para o Ano da Fé
Dom Eduardo Benes de Sales Rodrigues - Arcebispo de Sorocaba  
 
“O Ano da Fé nasce da percepção de que há uma crise de fé em nosso mundo que atinge também, e fortemente, os cristãos”. Essa crise assim vem descrita: “Enquanto, no passado, era possível reconhecer um tecido cultural unitário, amplamente compartilhado no seu apelo aos conteúdos da fé e aos valores por ela inspirados, hoje parece que já não é assim em grandes setores da sociedade devido a uma profunda crise de fé que atingiu muitas pessoas”(PF, n. 2). Elencamos alguns fatores que explicam essa crise: 1. Os filhos, mais numerosos que hoje, viviam a maior parte no tempo sob a influência da família e todas as famílias eram mais ou menos iguais no que diz respeito à religião e aos costumes. Hoje os filhos passam a maior parte do tempo sob a influência de outras instâncias e têm contato permanente com formas de pensar e de viver diferentes daquelas de sua própria família. Tornou-se freqüente que pais cristãos se queixem de que seus filhos não os acompanham mais na prática da própria religião. Há espaços sociais e culturais que estão absolutamente fora do controle familiar onde alternativas outras, muitas vezes opostas, de como viver exercem forte influência nas novas gerações. Acrescente-se a essa mudança o espaço das redes sociais onde tudo se discute, onde se comunicam as mais variadas experiências e onde se contestam os valores tradicionais que teceram as relações sociais no regime de cristandade. 2. A industrialização, com o acelerado e desordenado processo de urbanização, quebrou a unidade cultural religiosa que caracterizava a sociedade de tipo rural. A migração para os centros urbanos trouxe insegurança para a população acostumada ao ritmo lento da vida rural, gerando também os problemas de desemprego e os bolsões de pobreza com conseqüente desestruturação da vida familiar, propiciando o desenvolvimento do comércio das drogas, verdadeiro flagelo social. Nesse contexto, a perda das raízes cristãs-católicas por parte de muitos e a necessidade de encontrar solução para as angústias emergentes de um contexto de anomia sociocultural abriram espaço para as mais variadas propostas religiosas vistas como resposta para as próprias aflições. Multiplicaram-se os grupos religiosos onde de certa forma as pessoas, nessa situação, encontram abrigo, segurança e orientação para suas vidas. 3. Uma cultura global, gestada pelo sonho de uma felicidade fácil, a ser concretizada pelo acesso aos bens de consumo, e um conceito de liberdade como possibilidade de satisfazer a todos os desejos, substitui a noção de ideal que exija dedicação, espírito de sacrifício e a procura de uma vida virtuosa bem como o empenho na construção de um mundo melhor para todos. Nesse contexto se tornam difíceis as opções definitivas de entrega da própria vida a uma causa ou a um ideal onde o bem do outro ou o bem de todos seja a razão do próprio viver. A felicidade não está em encontrar uma verdade que dê sentido à totalidade da existência e, portanto, ao viver e ao morrer; a felicidade consiste em viver com intensidade prazerosa o momento. Dispensa-se a questão do sentido e fica abolido qualquer tipo de escatologia, individual ou coletiva. 4. Nesse contexto o Santo Padre chama a atenção para o fato de que muitos cristãos se preocupam mais com “as consequências sociais, culturais e políticas da fé do que com a própria fé, considerando esta como um pressuposto óbvio da sua vida diária”. É preciso observar que o Santo Padre não nega a importância dessa preocupação que, aliás, na América Latina, ocupou amplo espaço no pensamento teológico e exerceu forte influência em nossas práticas pastorais. Sua constatação é que chegamos a um ponto em que o pressuposto – a fé viva – que deve sustentar a prática cristã no mundo da cultura e da política vem se esvaziando progressivamente. De fato, fazemos o discurso sobre a necessidade de uma cultura onde se valorize a dignidade da pessoa e de uma prática política que valorize a vida e procure o bem comum e nos deparamos com uma prática completamente alheia aos princípios do evangelho. Não temos cristãos suficientemente formados e comprometidos com o evangelho no mundo da profissão, das artes, das ciências e da política.
No Sínodo dos bispos, recentemente realizado no Vaticano, o Card. Péter Erdö, primaz da Hungria, falando sobre a Europa, ressaltou a "perda da memória da herança cristã" nesse continente, com a consequente descristianização galopante, seguida de hostilidade e de violência contra os cristãos em quase todos os países! Referiu-se aos "direitos humanos de terceira e quarta geração... que já não possuem laços com a visão humana e cristã do mundo nem com a moralidade objetiva expressa nas categorias do direito natural”. A crise de fé gira em torno da questão de Deus: sua existência e sua relação com o mundo. (continua).
 
Dom Eduardo

“O Ano da Fé nasce da percepção de que há uma crise de fé em nosso mundo que atinge também, e fortemente, os cristãos”. Essa crise assim vem descrita: “Enquanto, no passado, era possível reconhecer um tecido cultural unitário, amplamente compartilhado no seu apelo aos conteúdos da fé e aos valores por ela inspirados, hoje parece que já não é assim em grandes setores da sociedade devido a uma profunda crise de fé que atingiu muitas pessoas”(PF, n. 2). Elencamos alguns fatores que explicam essa crise: 1. Os filhos, mais numerosos que hoje, viviam a maior parte no tempo sob a influência da família e todas as famílias eram mais ou menos iguais no que diz respeito à religião e aos costumes. Hoje os filhos passam a maior parte do tempo sob a influência de outras instâncias e têm contato permanente com formas de pensar e de viver diferentes daquelas de sua própria família. Tornou-se freqüente que pais cristãos se queixem de que seus filhos não os acompanham mais na prática da própria religião. Há espaços sociais e culturais que estão absolutamente fora do controle familiar onde alternativas outras, muitas vezes opostas, de como viver exercem forte influência nas novas gerações. Acrescente-se a essa mudança o espaço das redes sociais onde tudo se discute, onde se comunicam as mais variadas experiências e onde se contestam os valores tradicionais que teceram as relações sociais no regime de cristandade. 2. A industrialização, com o acelerado e desordenado processo de urbanização, quebrou a unidade cultural religiosa que caracterizava a sociedade de tipo rural. A migração para os centros urbanos trouxe insegurança para a população acostumada ao ritmo lento da vida rural, gerando também os problemas de desemprego e os bolsões de pobreza com conseqüente desestruturação da vida familiar, propiciando o desenvolvimento do comércio das drogas, verdadeiro flagelo social. Nesse contexto, a perda das raízes cristãs-católicas por parte de muitos e a necessidade de encontrar solução para as angústias emergentes de um contexto de anomia sociocultural abriram espaço para as mais variadas propostas religiosas vistas como resposta para as próprias aflições. Multiplicaram-se os grupos religiosos onde de certa forma as pessoas, nessa situação, encontram abrigo, segurança e orientação para suas vidas. 3. Uma cultura global, gestada pelo sonho de uma felicidade fácil, a ser concretizada pelo acesso aos bens de consumo, e um conceito de liberdade como possibilidade de satisfazer a todos os desejos, substitui a noção de ideal que exija dedicação, espírito de sacrifício e a procura de uma vida virtuosa bem como o empenho na construção de um mundo melhor para todos. Nesse contexto se tornam difíceis as opções definitivas de entrega da própria vida a uma causa ou a um ideal onde o bem do outro ou o bem de todos seja a razão do próprio viver. A felicidade não está em encontrar uma verdade que dê sentido à totalidade da existência e, portanto, ao viver e ao morrer; a felicidade consiste em viver com intensidade prazerosa o momento. Dispensa-se a questão do sentido e fica abolido qualquer tipo de escatologia, individual ou coletiva. 4. Nesse contexto o Santo Padre chama a atenção para o fato de que muitos cristãos se preocupam mais com “as consequências sociais, culturais e políticas da fé do que com a própria fé, considerando esta como um pressuposto óbvio da sua vida diária”. É preciso observar que o Santo Padre não nega a importância dessa preocupação que, aliás, na América Latina, ocupou amplo espaço no pensamento teológico e exerceu forte influência em nossas práticas pastorais. Sua constatação é que chegamos a um ponto em que o pressuposto – a fé viva – que deve sustentar a prática cristã no mundo da cultura e da política vem se esvaziando progressivamente. De fato, fazemos o discurso sobre a necessidade de uma cultura onde se valorize a dignidade da pessoa e de uma prática política que valorize a vida e procure o bem comum e nos deparamos com uma prática completamente alheia aos princípios do evangelho. Não temos cristãos suficientemente formados e comprometidos com o evangelho no mundo da profissão, das artes, das ciências e da política.
No Sínodo dos bispos, recentemente realizado no Vaticano, o Card. Péter Erdö, primaz da Hungria, falando sobre a Europa, ressaltou a "perda da memória da herança cristã" nesse continente, com a consequente descristianização galopante, seguida de hostilidade e de violência contra os cristãos em quase todos os países! Referiu-se aos "direitos humanos de terceira e quarta geração... que já não possuem laços com a visão humana e cristã do mundo nem com a moralidade objetiva expressa nas categorias do direito natural”. A crise de fé gira em torno da questão de Deus: sua existência e sua relação com o mundo. (continua).

Dom Eduardo



******************************************************


Artigo publicado no Jornal Cruzeiro do Sul - Sorocaba-SP

21/06/2012 |ARTIGO

Porta Fidei

Notícia publicada na edição de 21/06/2012 do Jornal Cruzeiro do Sul, na página 3 do caderno A - o conteúdo da edição impressa na internet é atualizado diariamente após as 12h.
"A PORTA DA FÉ (cf. At 14, 27), que introduz na vida de comunhão com Deus e permite a entrada na sua Igreja, está sempre aberta para nós "(n. 1). Com estas palavras o Papa começa a Carta Apostólica de proclamação do Ano da Fé, donde chamar-se esse documento "A Porta da Fé" , expressão colhida em At. 14,27, quando Paulo e Barnabé, retornando de sua primeira viagem missionária, narram as maravilhas operadas por Deus e como Deus "havia aberto a Porta da Fé aos gentios" ( At 14,27).

A porta da fé é a porta pela qual se entra no universo do mistério de Deus, revelado em Cristo. O Ano da Fé nasce da percepção de que há uma crise de fé em nosso mundo que atinge também, e fortemente, os cristãos. Donde a necessidade de retomar, na oração e na reflexão, o significado profundo da fé enquanto entrega plena do próprio ser ao Deus que se revela em Cristo, bem como de procurar compreender as verdades fundamentais com as quais a fé cristã é professada para melhor vivê-las e anunciá-las.

Destaco três trechos da "Porta Fidei" que nos ajudam a compreender as razões do Ano da Fé: a) "Sucede não poucas vezes que os cristãos sintam maior preocupação com as consequências sociais, culturais e políticas da fé do que com a própria fé, considerando esta como um pressuposto óbvio da sua vida diária. Ora um tal pressuposto não só deixou de existir, mas frequentemente acaba até negado. Enquanto, no passado, era possível reconhecer um tecido cultural unitário, amplamente compartilhado no seu apelo aos conteúdos da fé e aos valores por ela inspirados, hoje parece que já não é assim em grandes setores da sociedade devido a uma profunda crise de fé que atingiu muitas pessoas"(n. 2).

b) "Queremos celebrar este Ano de forma digna e fecunda. Deverá intensificar-se a reflexão sobre a fé, para ajudar todos os crentes em Cristo a tornarem mais consciente e revigorarem a sua adesão ao Evangelho, sobretudo num momento de profunda mudança como este que a humanidade está a viver" (n. 8). c) Não obstante a crise de fé provocada por uma cultural secularista e hedonista, "não podemos esquecer que, no nosso contexto cultural, há muitas pessoas que, embora não reconhecendo em si mesmas o dom da fé, todavia vivem uma busca sincera do sentido último e da verdade definitiva acerca da sua existência e do mundo. Esta busca é um verdadeiro "preâmbulo" da fé, porque move as pessoas pela estrada que conduz ao mistério de Deus. De fato, a própria razão do homem traz inscrita em si mesma a exigência "daquilo que vale e permanece sempre". Esta exigência constitui um convite permanente, inscrito indelevelmente no coração humano, para caminhar ao encontro d"Aquele que não teríamos procurado se Ele mesmo não tivesse já vindo ao nosso encontro. É precisamente a este encontro que nos convida e abre plenamente a fé"(n. 10).

O Santo Padre deseja que o "Ano da Fé", que se estende desde 11 de outubro deste ano até 24 de novembro de 2013, seja de aprofundamento dos ensinamentos do Concílio Vaticano II e que o Catecismo da Igreja Católica seja a principal fonte de aprofundamento da fé cristã por parte de todos os católicos. O Credo cristão deve ser retomado com renovado entusiasmo por todos para ser mais bem compreendido e melhor vivido. Para motivar-nos o Santo Padre coloca diante de nossos olhos as palavras de santo Agostinho aos candidatos ao batismo de seu tempo: "O símbolo do santo mistério, que recebestes todos juntos e que hoje proferistes um a um, reúne as palavras sobre as quais está edificada com solidez a fé da Igreja, nossa Mãe, apoiada no alicerce seguro que é Cristo Senhor. E vós recebeste-lo e proferiste-lo, mas deveis tê-lo sempre presente na mente e no coração, deveis repeti-lo nos vossos leitos, pensar nele nas praças e não o esquecer durante as refeições; e, mesmo quando o corpo dorme, o vosso coração continue de vigília por ele."(n. 9).

Por isso o Santo Padre nos convida: "É precisamente nesta linha que o Ano da Fé deverá exprimir um esforço generalizado em prol da redescoberta e do estudo dos conteúdos fundamentais da fé, que têm no Catecismo da Igreja Católica a sua síntese sistemática e orgânica. Nele, de fato, sobressai a riqueza de doutrina que a Igreja acolheu, guardou e ofereceu durante os seus dois mil anos de história. Desde a Sagrada Escritura aos Padres da Igreja, desde os Mestres de teologia aos Santos que atravessaram os séculos, o Catecismo oferece uma memória permanente dos inúmeros modos em que a Igreja meditou sobre a fé e progrediu na doutrina para dar certeza aos crentes na sua vida de fé"(n. 11).

A Igreja de Sorocaba deverá envidar todos os meios para viver o Ano da Fé na escuta da Palavra colhida na Bíblia e sistematizada no símbolo apostólico tal como vem explicado no Catecismo da Igreja Católica.

 Dom Eduardo Benes de Sales Rodrigues é arcebispo metropolitano da Arquidiocese de Sorocaba
 
 
 

Nenhum comentário:

Postar um comentário